segunda-feira, 16 de junho de 2014

Pimenta Rosa

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Examine uma lista de notas fragrantes hoje em dia, tanto no departamento de perfumes comerciais de uma loja ou em linhas de perfume de nicho, e encontrará pimenta rosa quase sempre. De repente, a pimenta rosa é quase tão omnipresente como o almíscar ou a rosa. Está em todo o lado. Depois de vê-la em alguns Chanel (como nos flankers de Chance ou em Bleu), Elle de YSLTresor Midnight Rose e afins, estará o consumidor mais esnobe cansado da pimenta rosa? Mas os mistérios desta matéria vão mais longe do que o seu carinhoso nome. A evocação colorida—tão literal nas bagas de um real rosa avermelhado que compramos para cozinhar—é uma benvinda diversão, e um pequeno presente de sonhos perfumados. Me chamem superficial, mas o meu coração pula quando me falam de alguma coisa com cores vivas. O vosso não?
BOTÂNICA E ETIMOLOGIA

A pimenta rosa, (baies roses em Francês), é uma espécie de pimenta obtida a partir das bagas berries da espécie Schinus molle e Schinus terebinthifolius, originalmente uma árvore da América do Sul (Brasil, Peru... ) com um aspeto parecido com o do salgueiro-chorão (saule pleurer ou Salix Babylonia). Formalmente conhecida como Baie rose de Bourbon ou Poivre de Bourbon, a pimenta rosa é também referenciada como poivre rosé (literalmente "pimenta rosa," graças à sua coloração), faux poivre ("pimenta falsa," porque não é picante) e com variadas denominações geográficas (Poivre brésilien, Poivre d'Amérique, Poivre de la Réunion), apesar de ser cultivada em outros locais (Madagáscar, perto das Reunão, e Nova Caledónia, principalmente). É conhecida desde o século V, de acordo com dados históricos, mas nunca foi tão popular como agora.
 
O nome schinus deriva do grego: σχίνος é o nome comum das árvores de lentisco, as plantas que produzem mástique, uma goma usada para se mastigar e tem uma série de aplicações (desde aromáticas a cosméticas e higiénicas), e as árvores de pimenta rosa produzem uma secreção que é de fato similar ao mástique (Schinus molle, refere-se à variedade peruana, enqanto terebinthifolius se refere à variedade brasileira). A pimenta rosa, contudo, vem das pequenas bagas avermelhadas secas da árvore e não da secreção da casca ou das folhas.
Apesar do nome dar a entender uma experiência intensa e exótica, o constituinte que faz da pimenta rosa uma pimenta é o careno, um terpeno apenas ligeiramente picante (os terpenos dão uma frescura como a do pinheiro ou da terebintina). Esmague um grão de pimenta rosa entre os seus dentes e repare como a sua língua não pega fogo como pegaria com a pimenta preta. A pimenta rosa não é exactamente tão picante como a pimenta preta ou mesmo a verde ou branca; estas dependem do seu constituinte pipereno para a sua faceta picante e produzem um ardor mais intenso no nosso nervo trigeminal, que regula a sensação olfativa intensa (interpretando-a como uma espécie de "dor" parecido com a que se sente quandos e cheira amonio).
ORIGENS DE UMA TENDÊNCIA QUE CONTINUA INABALÁVEL

A popularidade da pimenta rosa como nota aromática deriva da sua crescente utilização como especiaria culinária nos últimos anos. De acordo com a Fauchon, "Baie de rose é saborosa, suavemente doce e perfeita para polvilhar sobre saladas mistas, carnes e frutos exóticos, entre outros pratos." De fato, o buquê de pimenta rosa é uma especiaria adocicada, levemente rosada que não arde na língua como a pimenta preta, e adiciona um suave toque a vários pratos; flexível como a salsa, delicada como a água de flor de laranjeira, ela traz aquele elemento especial. Para além disso os vapores de uma caçarola de carnes brancas com pimenta rosa perfumam deliciosamente a cozinha! (Faça uma infusão de pimenta rosa com manteiga e espalhe no seu rabo de boi antes de cozinhar, ponha um pedaço em vinagrete e deixe repousar. Depois esmague frutas doces sobre isto e me agradeça depois, melhor ainda, se estiver em Osaka, pegue num desses chocolates decorados com pimenta rosa.)
 
O comprador consciente deverá rejeitar os coloridos "moinhos" com pimenta verde, branca e rosa vendidos nas lojas; o sabor será fraco e o cheiro quase ausente, a coisa é mais ornamental do que útil para o uso na cozinha ou na perfumaria.
Diptyque tornou-se famosa pela sua vela Baies (e pelo correspondente perfume de ambiente) que, no entanto, cheira a rosas e folhas de groselha: de certa forma esta combinação ecoa na sua delicada fragrância evocativa de Ofélia L'Ombre Dans L'Eau, mas foi o culto das celebridades por esta vela (que apareceu em O Sexo e a Cidadeno apartamento de Carrie) que a tornou ultra-reconhecível. Foi o suficiente para criar uma familiaridade com o consumidor de nicho: baies, bagas, e o salto para a pimenta rosa não estava longe!
Mas a primeira fragrância a fazer uso da pimenta rosa como nota distinta numa fragrância foi nada mais nada menos do que o best-seller (e largamente trend-setting)Pleasures de E.Lauder, de 1995. Aqui reside a parte interessante: os perfumistas não esmagam as bagas para extrair líquido ou óleo. Não. A pimenta rosa é uma nota cuidadosamente construída, o que explica a sua corrente popularidade; a tecnologia passou à frente. É claro que a inovação não era simples até chegar ao resultado perfeito. Lauder usou os padrões de ouro da International Flavors & Fragrances: a técnica de "extração suave" através da qual o dióxido de carbono em estado supercrítico (ou seja, entre o líquido e o gás) passa por entre as bagas secas e "suavemente" extrai as moléculas da essência, sem deixar marcas no cheiro. Isto produz um aroma mais "puro", com notas de topo cintilantes, em vez das essências pesadas derivadas das técnicas tradicionais de extração.
Os perfumistas Geza Schoen e Jean-Claude Ellena adoraram isto. Schoen usou pimenta rosa em quase toda a linha Ormonde Jayne, uma colação cuidadosamente dirigida por Linda Pilington que faz uso das moléculas mais trendy de forma a conseguir perfumes artisticamente honestos que atraem até os mais tradicionalistas.IsfarkandOrmonde ManZizan e Orris Noir são apenas o começo... Escentric 01 de Escentric Molecules (a linha própria de Schoen) é ainda mais aventureira para quem esteja preparado.
Jean Claude Ellena salientou a pimenta rosa em muitas das suas criações, começando pelo famoso Rose Poivrée (da sua The Different Company) e expandindo-se bem com Angeliques sous la pluie para a coleção Frederic Malle em que as facetas parecidas com o zimbro da pimenta rosa (em vez do rosado doce, como acontece na maior parte dos perfumes mainstream que usam esta nota) fazem par com a angélica e dão uma evocação de gin tónico que é tão boa que quase se pode beber!
Num relatório de tendências para 2012 pela Scentsy.com, a pimenta rosa era declarada "a nota do futuro." Agora, já sabe que é verdade. Existem razões de marketing para isso, é claro. "A pimenta rosa adequa-se ao espírito do nosso tempo," explica Heidi Thompson, Presidente da Scentsy, Inc. num press release. "É uma nota de fragrância espirituosa que oferece inspiração para a aventura, para se ser romântico ou simplesmente para dar um toque de entusiasmo a quelquer aspeto da vida." Tom Pastre, Presidente da Creatique, uma empresa de consultoria para a indústria da perfumaria situada em Cresskill, Nova Jérsia, diz, "a pimenta preta é adequada para esta época de desafios porque é animadora e tem um certo otimismo. É forte e picante, mas tem um calor reconfortante. É esse contraste que a torna excitante: feminina e floral, contudo sexy e exótica."
Bom, não é mais do que outras notas fragrantes, mas você sabe como as tendências funcionam. Elas são-nos impostas.
OUTRAS NOTÁVEIS FRAGRÂNCIAS COM NOTAS DE PIMENTA ROSA
Seria fútil, quase impossível, registrar toda e qualquer fragrância com notas de pimenta rosa. Como eu disse, ela está em todo o lado ultimamente. Por isso as seguintes menções são apenas uma inspiração para ir cheirar e encontrar a sua fragrância especial que exprima esta nota.
Le Labo joca com um princípio interessante em Baie Rose 26, por isso cautela, caro comprador, intrigado e interessado: baies roses significa pimenta rosa, baie rose indica uma baga vermelha (independente do seu calor apimentado existir ou não) e a fragrância em si, composta pelo perfumista Frank Voelkl, é intensa em especiarias spicy, cravo e pimento. A evocação é mais literalmente numa faceta da essência da pimenta rosa (o rosado doce) do que a soma das suas partes. Mantenha isso em mente.
L'Artisan Parfumeur Poivre Piquant é uma fragrância especiada pouco conhecida que usa a nota de pimenta rosa de uma forma interessante. Bertrand Duchaufour usa a pimenta rosa em Aedes de Venustas de L'Artisan Parfumeur assim como em Al Oudhe no perfume de incenso Timbuktu para a mesma marca.
Rose Poivrée da Different Company (e composto por Jean-Claude Ellena) tornou amplo o uso da pimenta rosa de uma maneira que salientou as suas qualidades quase humanas, emparelhadas com notas atrevidas e íntimas, o que é o jogo preferido deste perfumista. Até o mestre dos orientais, certamente mais conhecedor de mais densas especiarias e de notas com mais mel e espessura do que esta, Serge Lutens, escolhe a pimenta rosa como nota de topo para Santal Blanc; a frescura e o caráter rosado é um bom contraponto para a austeridade das aparas de lápis do cedro.
Eau de Merveilles tem também uma nota de pimenta rosa, afogada talvez em toda a pele salgada e banhada em laranja, mas está lá se a quiser descobrir. Um caso similar é o "aroma de pele" Archives 69 de Etat Libre d'Orange em que o almiscarado é aliado ao rosado da especiaria. Mauer & Wirtz usou pimenta rosa com essências cítricas para reforçar o aspeto de frescura da baga na sua renovada e re-embalada linha 4711; um achado, com estes preços e uma bela embalagem retro.
Bang de Marc Jacobs tem uma "frescura especiada" bem, masculina; mas o lado apimentado da pimenta preta lado-a-lado com o iso-e super faz lembrar o trabalho dos perfumistas Schoen e Ellena. A fragrância é forte, distinta e ainda assim muito usável (tal como toda a linha Jacobs, mas provavelmente o melhor de todos os seus perfumes).
Como com outras notas de perfumes, a pimenta rosa não é o oito nem o oitenta da perfumaria. É contudo uma versão moderna da moda das especiarias frescas que deveríamos todos ter o cuidado de experimentar antes de rejeitar. A familiaridade ou a omnipresença pode enganar e lavar a que se perca algumas das coisas boas que por aí andam!

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