domingo, 28 de fevereiro de 2016

Viciado em perfume: Os piores perfumes que já senti

por: Dr. Marlen Elliot Harrison

Desde criança meus pais influenciaram fortemente minha paixão e me iniciaram no universo da fragrância. Cada um deles tinha um perfume que era sua assinatura, e o aroma deles regularmente sempre estiveram no ar como uma brisa; eu sempre soube o que exatamente comprar. Enquanto eu gostava da baunilha picante do Shalimar de Guerlain de minha mãe, já me sentia um tanto indiferente ao cítrico musk da Royal Copenhagen do meu pai. Ambos os perfumes eram super básicos para meus pais e eles raramente tinham uma segunda alternativa, no caso minha mãe se satisfazia com um Anaïs Anaïs de Cacharel, e meu pai com uma única garrafa do originalAzzaro pour Homme.
Um dos meus anúncios favoritos de Shalimar, de 1968, "Um tributo ao início do amor”.
Minha mãe tinha o hábito de regularmente ganhar como presentes outros perfumes, mas nunca os usava; sempre ficavam no armário para serem representeados para alguém sortudo (a) no futuro. Mas houve uma exceção - uma fragrância que de alguma forma nunca fora doada e de seu armário não desaparecia. Talvez porque a pessoa que deu o presente tenha sido muito simpática ou até mesmo a fragrância poderia ter algum tipo de significado especial.
Certa vez durante uma arrumação em casa, arrumando e embalado perfumes do armário da minha mãe, eu realmente tive que dar uma fungada desse perfume misterioso, e devo dizer que: foi, simplesmente, a pior coisa que eu já tinha cheirado em toda a minha vida (doravante ele era simplesmente foi um BLÉÉÉ para mim). Após ter cheirado aquele BLÉÉÉ, fiz exatamente uma cara semelhante a do rapaz do GIF abaixo:
"Isso é um perfume?!" Eu perguntei.
"O que você quer dizer?!" Minha mãe respondeu.
"Quero dizer... Isso... É nojento."
Tornei cheirar novamente e ela acrescentou: "Ele é francês, e foi um presente".
"É terrível, a pior coisa que eu já cheirei na vida", concluí.
Eu nunca esqueci aquele aroma - amargo, oleoso, seco e pesado em uma mistura que remetia a tubo de aspirador de pó prestes a pressão em seu uso excessivo, começando a queimar já após longas horas de uso. Ou talvez ele me remetesse também a cheiro de cabelo chamuscado. Ou quem sabe aos odores das grandes garagens industriais de estação de gás.
Por curiosidade e em resposta aos comentários impressionantes e apaixonados sobre o tal perfume BLÉÉÉ aqui no Fragrantica, reconheço que quando conheci tal aroma o encarei com um nariz inexperiente de uma criança. Talvez se meu farejador já fosse mais maduro e refinado, certamente reagiria de forma diferente. Talvez fosse hora de experimentar aquele BLÉÉÉ novamente.
Sendo assim, longe do e-bay, fui atrás de uma garrafa para mim, e não foi difícil encontrá-la, seu preço é foi bastante acessível e o mesmo ainda está em produção nos dias de hoje com o aroma intacto, mesmo depois de 55 anos de existência! Eu mesmo optei por uma versão EDP, como foi apenas alguns dólares a mais do que a EDT e para que eu pudesse examinar o BLÉÉÉ em toda sua suposta glória.
Quando adquiri minha garrafa eu estava bastante ansioso por antecipação. Estava eu prestes a encarar um demônio do passado ou me reencontrar com uma fragrância retrô, chyprada madura, com foco nas notas de couro?! Eu esperava por algo que evocasse as imagens que seguem abaixo:
Ou talvez isto:
Cuidadosamente abri a caixa e fui imediatamente lembrado da garrafa, já a conhecia desde minha infância, embora esta versão mais recente já não fosse tão octogonal, de vidro transparente e mais plano em ambos os lados.
Dei uma única borrifada no pulso e para minha decepção, vivenciei o mesmo fedor lá do passado. "Ah não!" eu pensei, "ele realmente é a pior coisa que eu já pude cheirar”.
Existem fragrâncias que cruzaram meu caminho que simplesmente não as apreciei em nada: muitas vezes estes aromas continham notas de Cominho, Madeira Gaiac, Musgo de Carvalho, Vetiver, Pau-Brasil ou Aldeídos. O tal BLÉÉÉ continha Musgo de Carvalho, Vetiver e Aldeídos. Um horror aquilo ali.
Marlon de forma nada distinta em Apocalypse Now
Imediatamente estendi meu braço à minha mãe, sentada na sala, fosse para sadicamente torturá-la com aquele cheiro ou ver se ela iria relembrar do tal, ou quem sabe os dois.
"O que é isso?" Ela perguntou com uma cara de desagrado.
"Você não reconhece?!" Perguntei.
"É terrível." Disse ela.
"Sim." Respondi.
"Talvez a pior coisa que eu já cheirei." Continuou minha mãe.
"Sim." Confirmei.
"BLÉÉÉ!" Fez minha mãe.
"Sim. E você o tinha em seu armário." Respondi.
"Nunca!" Ela disse.
"Você o tinha guardado, sim." Eu insisti.
"Eu nunca usei uma coisa dessas! Isso é nojento!" Ela disse aborrecida.
"Eu não disse que você usava, mas você já o possuiu sim. Você disse ter ganhado ele como presente." Finalizei.
Feito. Todas minhas suspeitas foram confirmadas, de que todos aqueles que elogiam esta monstruosidade em forma de fragrância não podem ser meus amigos. O mau cheiro era tão ruim que eu tive que lavar meu braço na pia imediatamente. Infelizmente, o tal BLÉÉÉ apenas desejava minha atenção, contudo persistentemente se recusava a deixar minha pele. Teimoso! E é exatamente o significado do nome desta dita fragrâncias.
Tabaco?! Couro?! Patchouli?! Certo – idêntico ao interior de uma bolsa de couro velha de uma fumante viciada no uso excessivo de batons. Sândalo?! Âmbar?! Almíscar?! Isso é sério? De jeito nenhum!
E assim foi – O tal BLÉÉÉ não era apenas uma mera idiossincrasia do nariz de uma criança, mas um aroma “fedorento”, por direito, que eu não poderia jamais pensar em algum dia me ver vestindo ele. Embora algumas pessoas próximas a mim terem dito que ele lembra ao perfume da imagem abaixo...
Já para mim ele lembrou algo completamente diferente:
Hoje entendo porque minha mãe manteve sua garrafa por todos esses anos guardada; ela não tinha coragem de punir alguém por lhe presentear com uma bomba nada cheirosa dessas.
Se você acompanha meus Artigos aqui no Fragrantica ou em qualquer outro lugar que eu escreva, você sabe que eu nunca escrevi nenhum comentário negativo sobre qualquer perfume que seja. Decidi conscientemente não usar mais que 500 palavras para descrever poeticamente sobre os odores abomináveis já um dia percebidos ao meu redor. Sempre revejo minhas fortes reações positivas, neste sentido, como forma de demonstrar suficientemente meu encantamento pelo mundo das fragrâncias, para me manter escrevendo pelos menos pelos próximos cem anos. No entanto, acredito que muitos de vocês possam ter se identificado com a anedota que lhes contei logo acima. E assim, da mesma forma que experimentamos um prato terrível em um determinado restaurante, devo dizer que qualquer um de nós, podemos também vivenciar tal experiência com uma determinada fragrância horrorosa em nosso cotidiano.

Por favor conte-nos sobre sua "nêmesis" perfumada ou o que para você representa BLÉÉÉ num comentário abaixo.

Imagens por ordem de aparição: Etsy.com; Giphy.com; Ernest Procter, "The Interior of a Garage Boulogne," Imperial War Museum; Etsy.com; Travel.India.com; Giphy.com; Wikipedia.org; Fragrantica.com; e-xpressor.com; Giphy.com
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