Nesta provinciana e sulista capital onde moro, mulheres da minha geração deveriam entender de perfumes e homens de bebidas alcoólicas ou drinks.
Entretanto estes dois caminhos se entrelaçam intimamente em singular semelhança, que percebi muito além da temporalidade universitária das aulas de biologia e química.
Se a prática laboratorial de pesquisa frutificou no encantamento com óleo de cedro (usado em microscopia), detergentes baratos banalizaram óleos de pinho, que no passado supus originados de espécies como zimbro, pinus ou pinheiros. Essências que me pareciam notadamente artificiais agressivas e pungentes.
Contudo a fragrância seca, amadeirada e ligeiramente ácida de uma bebida, cujo principal aromatizante está nas bagas ou cones verdes de zimbro, despertou minha atenção para um aroma mais atraente e de boa qualidade.
Gin, destilado de fortíssimo teor alcóolico, diluído na fabricação com água destilada para se adequar ao consumo.
É obtido de cereais e diferenciado em dois grupos de acordo com o processo de aromatização ou enriquecimento de sabor.
Considerado de melhor teor e o mais requisitado é gin destilado inúmeras vezes, na presença de aditivos botânicos que vão de raízes à sementes.
Originalmente produzido na Inglaterra, London Dry Gin, a categoria mais conhecida e vendida não contém açucar e corantes, mas se distingue pelo espírito amadeirado e seco.
Este refinamento de sabor se deve a repetidas destilações com diferentes produtos naturais botânicos.
Tal variedade de gin comumente recebe casca de laranja amarga ou limão, ocasionalmente cítricos como lima e grapefruit e coquetel equilibrado de inúmeras especiarias. Pode conter raízes de anis, angélica, íris e alcaçuz; casca de canela, cassia, açafrão, coentro, noz-moscada, grãos do paraíso, frankincense...
Whitley e Neil, tradicional casa inglesa, que persiste na fabricação de London Dry Gin dentro da Inglaterra, adiciona baobá africano e groselhas!
Blackwood, gin seco do norte da Escócia, ligeiramente esverdeado, apresenta aroma sutil e fresco baseado em vários componentes da região. Recebe adição de plantas aquáticas, bagas de zimbro, arcangélica, coentro, limão, casca seca de laranja, casca de cassia, raíz de alcaçuz em pó, noz-moscada, canela, raíz de lírio, violeta.
Eis o ponto de convergência com perfumaria!
Impossível não sentir familiaridade com as conhecidas pirâmides olfativas referenciando através de aromas populares os ativos químicos, botânicos ou animais utilizados na composição das fragrâncias.
Para entender Juniper Sling de Penhaligon's comecemos pelo observação olfatória de gin.
Notaremos assim que a elaboração desta eau de toilette corresponde plenamente as expectativas, a proposição da deliciosa campanha, ao prometer aroma buliçoso e fresco, na interessante correlação com despreocupada juventude londrina dos anos 20.
Conceitos holísticos afirmam que personalidade associada à juniper ou zimbro é profundamente espiritual, perfil que despreza a autoridade, e se deixa guiar pela intuição, que aprecia se divertir e o faz sem medo, parecendo ocasionalmente imaturo ou irresponsável.
Correlação exata e pontual com o passado, que serviu de partida para a tradicional casa inglesa trilhar caminhos contemporâneos.
Experimentando Juniper Sling senti de imediato uma cascata aromática límpida, afiada e luminosa, temperada por notas que lembram tanto anis e erva-doce (anetol?) quanto gengibre in natura, de sumo picante e doce.
Reaplicando, em outro momento, revelou no acorde inicial verde, úmida e elegante nota de zimbro.
Assim mimetizou o conceito da referida geração européia, embora desprovido dos excessos comportamentais dos borbulhantes anos 20.
Acorde aromático que precede temperos quentes e densos, talvez coentro clamando parceria com couro, picante abafado e com suave animalic.
Senti a multiplicidade aromática da bebida alcoólica, cuja característica agrada mais ao olfato do que ao paladar, rondando discreta, alternando com a peculiaridade herbal cítrica de zimbro.
Ladeados por cedro, incenso e raízes, acorde finalizando em madeiras florais e almiscaradas, embebidas de doçura caramelada.
Caminhos de London Dry Gin e Juniper Sling cruzam a mesma paisagem, cuja flora é semelhante, entretanto o fazem em tempos diferentes.
O primeiro, tradicional e originado nos balcãs, que alternou fases conturbadas de glória e de má-fama, encontra na riqueza aromática paralelo com o segundo, fundamentado nos conceitos e substâncias da perfumaria moderna.
Sillage comportada, exuberante no topo é mais discreta do coração ao drydown, e agradavelmente prolongada sobre a pele.
Na minha experimentação permaneceu ativo durante muitas horas, percebível durante movimentos e próximo ao corpo,apesar da natural acomodação olfativa. Refinada e suave.
Juniper Sling é absolutamente confortável e elegante do princípio ao fim.
Fruto da talentosa atuação de Olivier Cresp acrescenta mais uma oferta aprazível ao menu da casa Penhaligon's.
Ignorando a diferença de acordes, se apresenta ao meu olfato uma opção tão agradável e relaxante quanto Eau Parfumée Au The Rouge de Bvlgari, constituindo verdadeiro "perfume conforto"...
Família Olfativa: Floral amadeirado aromático, 2011
Gênero: Unissex
Perfumista: Olivier Cresp
Rastro: Intenso a moderado
Fixação: Muito Boa
Pirâmide Olfativa:
- Topo - Canela, licor de laranja, arcangelica ( jacinto-da-índia ou erva-de-espírito santo), bagos de juniper ou zimbro
- Coração - Cardamomo, couro, pimenta preta, raiz de íris, madeiras
- Base - Açucar mascavo, cereja negra, vetiver, ambrox
- Japão
- Uk e EU
- USA e CA
VÍDEO: Bright Young Things - cenas do filme.
Imagens: Montagens com imagens de Elisabeth Casagrande, espécies botânicas da web-wikipedia, cena de Bright Young Things, garrafas de gin inglês.
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